sexta-feira, 31 de julho de 2009

Quem diria, Maria

Hoje é só mais um dia
E a borboleta que nasceu ontem
A essas horas já voou de verdade

Quem diria, Maria
Que a melancolia está na lagarta
E que ser borboleta
é ilusão de liberdade



Achei num blog meu antigo e tou apenas repostando.
Ainda faz sentido

quinta-feira, 30 de julho de 2009

O tempo passa, o tempo voa.

E Andrea Doria continua Andrea Doria e me faz chorar.


(andrea doria - legião urbana)

Às vezes parecia
Que de tanto acreditar
Em tudo que achávamos
Tão certo

Teríamos o mundo inteiro
E até um pouco mais
Faríamos floresta do deserto
E diamantes de pedaços
De vidro

Mas percebo agora
Que o teu sorriso
Vem diferente
Quase parecendo te ferir

Não queria te ver assim
Quero a tua força
Como era antes
O que tens é só teu
E de nada vale fugir
E não sentir mais nada

Às vezes parecia
Que era só improvisar
E o mundo então seria
Um livro aberto

Até chegar o dia
Em que tentamos ter demais
Vendendo fácil
O que não tinha preço

Eu sei é tudo sem sentido
Quero ter alguém
Com quem conversar
Alguém que depois
Não use o que eu disse
Contra mim

Nada mais vai me ferir
É que eu já me acostumei
Com a estrada errada
Que eu segui
E com a minha própria lei

Tenho o que ficou
E tenho sorte até demais
Como sei que tens também

terça-feira, 28 de julho de 2009

Eu quebrei a estátua de dragão.

Compramos uma bonita estátua de dragão. Vermelho, escamas com um tom de dourado, asas abertas, boca aberta, língua para fora, em cima da pedra. O dragão estava se apresentando, sem medo nenhum, desafiando a nós, pobres mortais. Garras afiadas e curvas.
Pois compramos. Éramos recém-casados. Eu achei que ficaria bem na sala de estar, na última prateleira.
Quando meu marido saía, eu notava como o dragão parecia estar me observando. Um dia jurei que tinha visto que a sua língua balançava como uma serpente. A princípio, não me importei. Coisa da minha cabeça.
Quando meu marido chegava, a vigília cessava.
...
Aconteceu que meu marido teve que viajar. À noite, sozinha, abri uma garrafa de vinho. O apartamento estava completamente em silêncio.
Um silvo violento quebrou a paz de tudo. Corri do nosso quarto para a sala: o dragão agora batia as asas. Me olhava. Bafo quente saía das suas narinas, infestava o ar. Fiquei tonta com o calor. Eu suava.

Joguei a estátua no chão. Um líquido transparente saiu das entranhas do bicho: eu não toquei, pois sabia que era veneno. Varri os restos. Levantei uma tábua no chão e o sepultei. Naquele dia, dormi tranquila.

No dia seguinte, porém, sonhei com o dragão. Eu montava nas suas costas e viajávamos, conhecendo as maravilhas do mundo. Em outro sonho, ele derretia gelo com seu bafo, pois eu tinha sede. No último encontro em sonho, eu era o dragão, o dragão era eu, e nós nos possuíamos.

Meu marido voltou pra casa e não me perguntou nada. Apenas olhou o lugar vazio e voltou a ler o seu jornal.
Fui eu que vi nos seus olhos a acusação.
Fui eu que novamente senti que a sala estava quente, muito quente, ardendo de um jeito que derreteria a nós todos, humanos.
Levantei a tábua.
Então eu gritei.

- FUI EU, FUI EU QUE QUEBREI O MALDITO DRAGÃO. AQUI ESTÁ, VEJA O ESQUELETO DELE, FUI EU. EU, SOZINHA, MATEI O MALDITO DRAGÃO.

Da minha voz saíam serpentes de fogo.

domingo, 26 de julho de 2009

Carta para outra

Uma carta pra outra que eu nem sei se gosta de carta.
Vai ser curta.

Só queria dizer que eu sempre enxerguei a sua dor. E tentei respeitar. A vida ensina que cada um tem a sua, então eu que não podia me infrigir uma nova dor, só pra você deixar de sentir aquela que sentia...
Naquele dia, eu ri, mas jamais seria de você. Acho que a razão de tudo em você parecer ainda duvidoso é que não tem nada inteiro ainda. É que seu espírito é levinho e é difícil pro meu acompanhar. E a razão do meu riso é sem razão.
Conselho de amiga: tenho a minha dor e aprendi com ela. Aprenda com a sua. Sabe o jeito que ela se apresenta? Como ela vem e pra onde ela vai? Pois preste atenção, que o provável é que aí more o segredo de você finalmente ser quem você é. Quando isso acontecer, espero que continue leve.

Uma carta pra ela

Ela gostava tanto de escrever carta, que eu acho que eu vou escrever uma carta pra ela.

Minha cara,
todo dia de manhã quando eu acordo, saúdo o sol, agradeço pela vida, lavo o rosto, olho bem nos meus olhos de pessoa cansada - além das olheiras há um quê de cansaço de tudo - aí então, penso nas possibilidades daquele dia. Quase sempre não tem nada. Mas é engraçado:eu acho tudo muito engraçado. Não sei, mora uma alegria dentro de mim. Não sei se a alegria em mim é a mesma alegria dos olhos da menina de suéter azul, cuja alegria tinha um ar de morte. Talvez agora minha alegria more onde estava o desespero dela.
Cortando esse papo, querida, o que eu queria mesmo dizer é que ter paciência e esperar é sempre um conselho bom, principalmente quando a gente se impressiona justamente porque enxerga as possibilidades de tudo.
Até quando a gente já esperou demais e foi tantas vezes urgente um toque ou uma palavra.
Até quando a gente se pergunta se agora ainda é muito cedo ou se vão ou não vão, pela primeira vez, deixar a gente ter aquilo que queria.

domingo, 19 de julho de 2009

Pensou, com seriedade, fitando os olhos daquele homem que se cobria de delicadezas:


- as pessoas são
o que são.


E falou:

-Olha, não é porque eu sou um passarinho que você precisa me tratar assim, desse jeito, meio delicado, meio falso.

saiu voando.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

tema batido

Chamava-se Júlia, pois estamos em julho e esse parece um bom nome.
Tinha dezoito anos quando adormeceu. Um dia normal: chegou do cursinho e, como estava cansada, dormiu cedo. Nem trocou de roupa ou escovou os dentes. Dormiu com a roupa suada, apostilas na cama. A imagem do cansaço.
Quando acordou, tinha vinte e nove anos. Ao seu lado, um estranho. Costas peludas. Um tanto quanto repugnante.
Olhando-se no espelho, deu-se conta: uma ruga! Na beiradinha da boca. Algo de ruguez se pronunciava também perto dos olhos. Espere. Não só isso: nariz, olhos e boca... Tudo diferente. O cabelo. Cacheado?! E uma cor, castanho dourado com as raízes pretas.
Não. Não era ela. Era outra. O quarto, o barulho do ar condicionado. Um motel barato. Unhas pintadas de um vermelho berrante. O homem levantou-se, abraçou-a e perguntou
-O que foi, Rosa Ângela, não vai ao banco hoje? Te deixo lá.
Aliança no dedo gordo do homem.
Obedeceu. Foi ao banco. Viu que era bom: bastava obedecer.
....
Do outro lado da cidade, uma mulher chamada Rosa Ângela recém Júlia acordava cansada. Mas tinha uma vida nova toda pela frente.


Eu não sei porque eu tô chorando.

Mas é por que
por quê
ou porquê

terça-feira, 7 de julho de 2009

Teço uma colcha:
Nela coloco as coisas bonitas do passado
Em algum e outro canto
os pontos ficaram meio soltos
Aperto
Aqui no presente
Fito o futuro
Imagino que coisas bordarei
Se ficar só de apertar os pontos
Nunca que eu vou poder me cobrir
Continuo tecendo